O temporal que no passado dia 1 de Novembro se abateu no Algarve e Baixo
Alentejo não sendo um fenómeno habitual, não é de todo inédito. Com superfícies
frontais de oeste e recuo depois de leste, que dão origem a tais tipos de
fenómenos, com quedas abundantes de precipitação, são desde a formação do
clima, naturais. Como natural é que a natureza tenha criado os seus próprios
mecanismos, para resolver esses fenómenos menos habituais e o Homem ao
instalar-se em certas zonas, sempre teve de se adaptar às condicionantes do
clima.
No entanto com a ascensão do capitalismo, do lucro imediato e da exploração
desenfreada dos recursos naturais, todo o conhecimento ancestral de
co-habitação com os fenómenos naturais foi cilindrado. É assim que desde há cem
anos, tempo em que se começou a construir nas margens da Ribeira de Albufeira,
mas com mais acutilância a partir dos anos 40 do século passado, que foram
pródigas as inundações com contornos violentos em Albufeira. Cheias causadas
por intensa pluviosidade, que engrossaram a ribeira e invadiram a vila, que foi
crescendo precisamente sobre a ribeira.
Nos últimos anos, têm sido noticiadas diversas inundações na cidade, mas as
últimas grandes cheias tinham ocorrido ainda nos anos de 1950.
Com as obras da Polis, toda a água das zonas rurais do lado Norte da
cidade, passou a desembocar naquela ribeira. Nas margens desta linha de
água, a câmara mandou construir um jardim, cuja obra chegou a estar embargada
pelo ministério do Ambiente. Com uma correcção ao projecto, os trabalhos
acabariam por ser concluídos. No leito da ribeira, agora Av. 25 de Abril, foram
implantados túneis, com um diâmetro inferior ao que seria aconselhável, o que
provoca o congestionamento das águas no seu curso natural para a praia, e,
consequentemente, inundações. Cerca de 800 metros desta avenida foram agora literalmente
devastados. Isto porque durante o Verão foram fechadas as quatro comportas
metálicas desses túneis e quando chegou a enxurrada, três encontravam-se encerradas,
formaram-se então diques e, a partir desse ponto de estrangulamento, a água
seguiu violentamente o seu percurso natural até ao mar, causando avultados
prejuízos em lojas, bares e habitações, além da morte de um cidadão, Francisco
Navio, a três dias de fazer 80 anos. Isto mostra, também, o desmazelo municipal
na manutenção das linhas de água e equipamentos.
Em declarações à agência Lusa,
Luís Alexandre, presidente da Associação de Comerciantes de Albufeira, disse
que tanto agora como em Setembro de 2008, quando se verificaram cheias
semelhantes na cidade, “a água bateu
nessas paredes, não ia para a praia, mas voltou para trás e levantou as tampas,
causando a inundação”. Sublinhou, ainda que, os prejuízos são
“avultadíssimos” e que existe, entre os comerciantes, um grande sentimento de
“revolta” pelo facto de ainda não terem sido ressarcidos das últimas cheias de
2008. De lembrar que a grande maioria destes comerciantes, têm pequenos
negócios que mal dá para sobreviverem e por isso não chega para pagar seguros,
que muitas vezes são exorbitantes. Isto contraria as declarações patéticas do ministro
da Administração Interna, João Calvão da Silva, em visita hoje à zona afectada,
segundo o qual cada comerciante “…em vez
de o gastar a mais aqui ou além, paga um prémio de seguro.”
Mas a juntar a estes factos, há
ainda aquele em que a Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e
Protecção Civil (ASPROCIVIL) criticou a Autoridade Nacional de Protecção civil
(ANPC) por não ter alterado, domingo o estado de alerta especial azul no
Algarve, que estava sob aviso vermelho por previsão de chuva forte. "A ASPROCIVIL não entende como é
possível que a ANPC, tendo conhecimento da previsão de condições de Risco
Extremo (aviso vermelho, do Instituto Português do Mar e da Atmosfera), tenha
mantido inalterado o estado de alerta especial azul para aquela região", quando
devia ter aumentado o nível de alerta, já que o IPMA tinha colocado sob aviso
vermelho, nível de situação meteorológica de risco extremo, o distrito de Faro,
devido à previsão de chuva forte entre as 9h e as 15h de domingo. Se assim
fosse, os meios de prevenção, em homens e material, seriam mais e mais
eficazes.
Importa agora que o governo,
ainda que moribundo, declare a calamidade pública para Albufeira e todos os
responsáveis por esta situação, desde os anteriores presidentes de Câmara e
governantes aos atuais sejam responsabilizados e julgados.
Os fenómenos da natureza não são
por si só calamitosos, nem desígnios de um qualquer deus, como pretende Calvão
da Silva, mas fruto do desleixo e do desenfreamento capitalista para com as
populações, na sua ânsia do lucro fácil e exploração descomedida.
O Homem tem de entender a
natureza, só depois é capaz de a dominar, respeitando-a sempre. Só com o fim deste
tipo de exploração e a instauração de uma sociedade em que tudo seja feito a
favor das populações, se poderá dar resposta cabal a estes e outros fenómenos
naturais, e a outros anti-naturais como o ministro Silva.
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